30 de jan. de 2011

Olha a chuva!

Os pingos da chuva começavam a pintar o asfalto num tom mais escuro gota por gota e todo o céu se fechou para ver a fúria das águas. Ou as gotas da chuva pintavam o solo para receber a escuridão das nuvens, que de tão bravas afugentaram o sol.

Em algum lugar da rua escutei um grito feliz, mas desesperado “Olha a chuva Maria!”. E como algum reflexo materno vi a vizinha sair correndo através da porta de alumínio e tentar resgatar as roupas no varal improvisado.

“Ai Jesus!” a vizinha vomitou enquanto tentava salvar o máximo de peças que pudesse, mesmo que debilitada pela idade e pela diabetes que escondidamente ela alimentava com as goiabadas camufladas sob o colchão da cama. De repente seu neto, um guri de pele quase negra e de incríveis olhos azuis, olhos que a avó dava ênfase em mostrar para as amigas de novena explicando ser da descendência italiana de seu genro e ingênua do adultério da filha, saiu correndo pela porta gritando, “chuuuva!” indiferente dos salvamentos da avó.

Automaticamente sendo repelido pela a avó, “Vai pra dentro menino!” e ele teimoso e na sua pureza infantil se divertia com essa dádiva da natureza que arrasa multidões pela arrogância e necessidade do homem.

Enquanto a avó terminava de recolher calçinhas e cuecas no último varal o menino parou atônito, impressionado pela beleza assustadora e atonal da fúria de um trovão que estremecia todo o espaço com a voz de sua gravidez.

“Eita porra!” gritou o menino e a avó mesmo atarefada o repreendeu pelo palavrão sujo e mais que perfeita síntese do que o menino não sabia exprimir.

E mais uma vez a avó o mandava entrar, o que foi inútil até o primeiro tapa cantar no ar em direção ao pequeno corpo, agressão com direito e em prol da continuação da estirpe que não poderia se terminar por uma simples gripe. O menino choroso voltou-se para debaixo do batente da porta e continuava a olhar para as nuvens, já esquecido da super proteção da avó.

Até que em algum momento de sua completa e pura inocência somada a uma observadora curiosidade viu uma estranha lógica de raios seguidos de trovões. E envolto por sua vontade perguntou para a avó, “porque o céu clareia antes do barulho vovó?”

A avó ainda ocupada no resgate das roupas lhe cuspiu qualquer resposta como, “porque deus assim quis!” e para o menino assim ficou, até que um dia, sem heresias descobriu que de algum modo natural, a luz, seja por sua leveza ou por sua constituição totalmente enérgica é sempre mais rápido que o som o que pra sua mente imaginativa e ainda impressionada com a potência dos trovões sempre acha que a luz vem como anunciação do estrondo do mundo em forma de trovão.

A avó recolheu as últimas peças do varal em meio a grande pingos d’água e voltou-se para dentro da rústica e simples casa quase atropelando o garoto que fantasiava entre as construções da porta, e antes que ele pudesse esperar pelas próximas luzes seguidas dos encantados e assustadores barulhos sua avó já o mandava para o chuveiro, retirar toda aquela friagem da chuva com pingos de chuva, mas dessa vez elétrica.

Atropelamento da vida.

------------- meus olhos estagnaram-se no espaço daquele instante em que aquele pavor invadia-me as pálpebras sem cerimônias, proporcionando-me um estranho prazer. E meu prazer envergonhava-se por sua incredulidade. E em uma fração de mim o mundo piscou para meus olhos. Antes que pudesse absorver o que acabava de ver meu prazer concretizava-se no tempo até se estagnar na morte do instante me deixando apenas o inexplicável gosto de seu pudor.

Do outro lado da rua uma criança expressava-se melhor do que eu apontando para o tapete de entranhas do rato atropelado sobre o asfalto. Estático tentava parar de tentar não olhar e me entreguei a mórbida curiosidade de olhar para o corpo estraçalhado do animal.

E na garganta me subia um amargo gosto, mas não era de bílis, nem muito menos de nojo, era o desejo que se alimentava por meus olhos. E me mantinha ali a observar aquela tragédia sem nenhuma culpa, era apenas um rato, o que também inflava no motorista do Chevette vinho que agora deveria estar entre a prefeitura e os escombros do antigo mercado um retórico perdão.

Eram aproximadamente dez e meia da manhã e eu continuava chocado pelo indiferente atropelamento da vida. Do outro lado da rua a criança continuava a espernear e gritava algo referindo-se ao corpo jogado em meio a rua, uma mulher de cabelos castanhos e de fisionomia cansada puxava a criança pela mão aos trancozinhos “Vem filho, ou vamos nos atrasar, é só um rato.” E a criança a ignorava e gritava cada vez com mais vida quase rompendo sua dependência da mãe, “Caraca você viu aquilo.” Ele soltou com exctasy olhando para a mãe, que já estava impaciente. Enquanto eu ainda observava as entranhas expostas sobre o asfalto e recordei-me de quando era criança e nessa mesma avenida vi as rodas de um carro que já não me lembro mais qual era, arrancar a vida de um pobre cãozinho. Lembro com um simples fechar de olhos cada mínimo e ridículo detalhe daquele dia, a roda, o cão tendo sua massa comprimida por uma mágica cruel que fez com que ele se achatasse e voltasse a seu volume em questão de segundos, o sangue escorrendo, saindo não sei mais por onde pois as formas já eram indefinidas e mesclas, mas era um cão. Segundos após o carro indefinido rabiscava o asfalto com o negro de seus pneus e a eficiência de seus freios. E eu, estático como a criança do outro lado da rua olhava aquela casualidade do horror, e as pressas o motorista indefinido do carro desconhecido já se debruçava com culpa sobre o corpo do cachorrinho e por uma vaga esperança ou por um leve desencargo de consciência pegava o cão quase morto e saia em direção de amparos para o já morto animal.

Durante todo esse tempo mantive-me imóvel tentava colocar em palavras todas aquelas imagens na minha ingênua cabeça de garoto, o animal tinha morrido, a insignificância com que a morte leva a vida, assim como do pobre rato, porém daquela vez o prazer não existiu, e agora tento me justificar pela indiferença que senti pelo rato.

Com estranheza fiz o sinal da cruz sobre o peito me redimindo da minha moralidade e segui e o garoto ia sumindo pela esquina com sua ingênua revelação, a única vez em que viu um delicioso sabor na morte, mas de tão inocente nunca soube que sentiu o que sentiu.

Enquanto sua mãe dizia,“Oras, é apenas um rato.” E o puxava pelas calçadas esburacadas da cidade.

22 de jan. de 2011

Don't Think Twice, It's All Right




It ain't no use to sit and wonder why, babe
If you don't know by now
An' it ain't no use to sit and wonder why, babe
It'll never do somehow
When your rooster crows at the break of dawn
Look out your window and I'll be gone


You're the reason I'm trav'lin' on
Don't think twice, it's all right

It ain't no use in turnin' on your light, babe
That light I never knowed
An' it ain't no use in turnin' on your light, babe
I'm on the dark side of the road
Still I wish there was somethin' you would do or say
To try and make me change my mind and stay
We never did too much talkin' anyway
So don't think twice, it's all right

So it ain't no use in callin' out my name, gal
Like you never done before
It ain't no use in callin' out my name, gal
I can't hear you any more
I'm a-thinkin' and a-wond'rin' walking down the road
I once loved a woman, a child I'm told
I give her my heart but she wanted my soul
But don't think twice, it's all right

I'm walkin' down that long, lonesome road, babe
Where I'm bound, I can't tell
But goodbye's too good a word, babe
So I'll just say fare thee well
I ain't sayin' you treated me unkind
You could have done better but I don't mind
You just kinda wasted my precious time
But don't think twice, it's all right

21 de jan. de 2011

O beija-flor.

E lá vem ele frenético e suave,
com suas asas a girar o mundo ao seu redor,
lindo e inocente meu amigo voador.
A procura do que aqui existiu,
das folhas que lhe inçavam ao vôo.

Tragando das ervas
a vida em essencial de sol e água
transformadas em doce recheio.
Com seu simples e estranho ventre microscópico,
menor que uma moeda, mas onde no mais minúsculo e inimaginável vazio,
nasce a vida.
Na natureza e dela se alimentando.

Fazendo árduo passeio entre os escombros dela,
em meio a nova natureza das coisas.

Continua ele à deriva na transmutação do espaço.
Escondendo seus ovos sobre as falhas da construção.

Sugando a vida entre as flores de plástico
recheadas por olhos atentos,
e mãos caridosas que lhe roubam
a essência de pássaro.
As mesmas mãos que lhe dão a síntese de um néctar,
por simples caridade cristã em agradecimento a sua desnorteante beleza.
E como um anjo desacreditado,
que brinca com as cores inocentemente
pinta um ponto verde no céu azul
e
trás o seu milagre em si.
E de repente transcende.
Só e imperceptível no mundo o pobre beija-flor.

18 de jan. de 2011

Poema metamorfico.

Pais repressores, Pais repressores.

jovens masturbadores, jovens masturbadores.

Pais repressores, Pais repressores.

mulheres submissas, mulheres submissas.

VIRILIDADE ESCROTA, VIRILIDADE ESCROTA!

Deus capitalista, Deus capitalista.

Pais repressores, Pais repressores.

Burguesia de merda, Burguesia de merda.

Pintos eletrônicos! Pintos eletrônicos!

Clitóris de látex, Clitóris de látex!

Usem vaselina! Usem vaselina!

Misantropia, Misantropia.

Encoxa um camarão ai! Encoxa um camarão ai!

Insanidade, Sanidade!

Hoje neva! Hoje neva!

Sanidade, Insanidade!

Repetição!

Poema conceitual! Poema conceitual!

Pós-modernidade, Pós-modernidade.

Poligamia Obrigatória, Poligamia Obrigatória.

Casamento anelar, Casamento anelar.

Vote nulo! Vote Nulo!

É a democracia, É a democracia!

Anarquia! Anarquia!

A esquerda tá de Nike e Che Guevara, Nike e Che Guevara.

Anfíbio felpudo, Anfíbio felpudo.

C-14 C-14, C-14 C-14.

Isqueiro dágua! Isqueiro dágua!

Loira de te-rê-rê, Loira de te-rê-rê.

Prometeu Plastificado! Prometeu Plastificado!

Samurai Americano, Samurai Americano.

Modernidade nostálgica, Modernidade Nostálgica.

Sapo ornitorrinco, Sapo ornitorrinco.

Negra de progressiva, Negra de progressiva.

Alemão rastafári, Alemão rastafári.

“Liberdade”, “Liberdade”.

Sol estourou! Sol Estourou!

O som acabou, o som acabou.

Blá Blá Blá mesas de bar.

Blá Blá Blá mesas de bar.